sábado, 8 de janeiro de 2022

La Africanita - 1915 - Pelo Brasil

 


    Nos anos 80 do século XIX, bailarinas espanholas imigravam e desenvolviam suas carreiras fora da Espanha, animadas pela oportunidade que ofereciam para trabalhar em circuitos diversificados em um meio cênico heterogêneo.

    A figura de la danzarina española virou um produto comercial seguro como na Rússia, Estados Unidos, França, Bélgica,  Alemanha e Inglaterra. Elas também se aventuravam na América, e dezenas no Brasil.

    La Africanita chegou ao Rio de Janeiro em 1915 com os seus “bailados hespanhoes” e 19 anos de idade, no "Theatro República" a anunciavam como madrileña.

     O Jornal a Notícia, do Rio de Janeiro, destacou que Africanita “dança com uma individualidade própria dando as malagueñas, seguidillas, jotas e sapateados a espiritualidade transcendente a sua beleza”. Além das danças citadas ela também bailou a “dança moruna e garrotin[1]”.

    Nesse mesmo ano esteve em São Paulo no Cassino Antártica; e na Bahia[2] noticiavam: “seus trabalhos nos Cafés Concertos, Cabarets, Theatros do sul e do norte tem sido muito apreciados das plateias pela arte e pela graça com que são executados”.

    Apresentou-se no luxuoso cinema da ladeira de São Bento o Theatro São João[3], junto com os bailarinos “Hermanos Monteritos”.

    Em 1916 foi novamente para o Rio de Janeiro, “(...) não admira muito, portanto que quando ela aparece envolta no mantón de Manilla para os seus bailados característicos, as palmas começam a estalar irreprimivelmente  obedientes a sugestão dos olhos dos espectadores encantados” [4] . Nesse ano ela esteve também no Recife "Cine Theatro Helvetica."

    Em 1917 dançou no Coliseu do Rio de Janeiro e em Minas Gerais, os jornais dessa época falaram em sua vontade de ir para os Estados Unidos.

Ela esteve no Rio Grade do Sul e os jornais citam seu nome entre 1918 e 1920, no Club dos Caçadores, considerado um dos Centros mais luxuosos da América do sul.

Encontrou-se algumas referências da Africanita fora dos jornais:

“...en los ’20 y ’30, cuando el cuplé magnetizaba al público desde cafés, salones y teatros, entonados por legendarias intérpretes como La Fornarina, La Chelito, Raquel Meller, La Africanita, La Goyita... [5]...” 

“ Sobre Antonio Amaya...  a la capital de España llegó con cincuenta pesetas como único capital en el bolsillo.Conocióo a una artista llamada "La Africanita",quien le abrió un poco los ojos en aquel dificil Madrid de la posguerra.”[6]

“Poco después empezaron a desarrollar sus carreras, tanto en España como en Europa, otras figuras que se dedicaron exclusivamente a popularizar los bailes españoles, gozando ya de pleno reconocimiento en 1905. Entre ellas destacaron en el género andaluz... La Africanita”[7]

 Em 1909 no México, citam no jornal uma apresentação  com uma bailarina chamada "La Africanita" numa reabertura de um cinematógrafo, (El Diário edição 1053).

 


 



[1] O Paiz 1915.

[2] A Notícia da Bahia.

[7] NAYA, Victoria Cavia . Mujeres, teatro, música y variedades: de las boleras y flamencas a las bailarinas de danza española (1885- 1927).


 Obs.: Caso queira retirar informações deste blog, por gentileza cite e referencie a pesquisadora deste lindo trabalho: Alessandra Gutierrez Gomes.


Maruja Natal e a “Boneca Luminosa” - 1940 - Florianópolis

 

                   Maruja Natal e a “Boneca Luminosa”



 

    Em 1940[1]  veio para o "Cine Rex" em Florianópolis (imagem acima) , acompanhada do tenor Fernad Rosel, Maruja Natal . Os jornais falavam do incrível sapateado de Maruja, uma graciosa estrela espanhola, cujo alto de sua apresentação era a “Boneca Luminosa”, onde a dançaria surgia no palco com dezenas de lâmpadas elétricas ornamentando seu corpo.



Porém a crítica de um jornal da cidade não foi nada graciosa...

 

Rosel e Maruja Natal - A extréa no “REX” dos dois “consagrados” artistas foi aquella desgraça...

 “Quem haja lido a propaganda feita por alguns jornaes desta capital as excepcionaes qualidades artísticas de Rosel e Maruja Natal, cuja estréa se verificou à noite passada no "Rex". julgar-se-ia em presença de duas verdadeiras notabilidades que, desgarradas do céo, tivessem sido trazidas “as azas de um anjo, para fazerem as delicias da nossa culta gente.

 Para dar maior vullo ao genio de Rosel, em vez do termo portuguez "cançonetista" preferiram esses jornaes afranceza-lo para "chansonier". E para impressionar mais profundamente o espírito dos apreciadores da arte, declarar que os pés ágeis e mimosos de Maruja Natal, tinham a leveza de dois pássaros a voar.

Emfim, tanta coisa bonita se disse que nos levou a recordar a extréa no theatro "Dona Amelia" da maior dentre as maiores bailarinas, Pastora Império  a quem os estudantes de Lisboa ébrios de enthusiasmo, terminado o espectaculo, desatrelaram os cavallos de caleche que a deveria conduzir ao hotel para, agarrados a lança uns, e fazendo das capas tirantes, outro arrastarem carro até ao "Franciort".

 Afinal, o que se viu no "Rex" foi aquella desgraça...

 Um Rosel, dando fifias, acompanhado de uma orchestra com cavaquinho e violão, sem graça e sem gestos, e uma Maruja Natal desordenada nos sapateados, batendo as castanholas sem rythmo.

 Como numero sensacional, extasiante, luxuoso e bello, estava segundo esses jornaes. A "Boneca Luminosa”, onde a "consagrada" artista iria sobresahir, com encanto, entre centenas de luzes, nos colleios estonteantes de um “ballet”.

 Este número foi também aquella desgraça...

 Maruja appareceu com um vestido recamado de lampadas eletricas,

 cujo-fio-conductor, atravessando o palco, mais parecia um cabo de amarrar navios, tirando, assim todo o effeito.

 Esse facto provocou, como era natural hilariedade na assistencia o que irritou a Rosel, o qual sem compostura, surgiu no palco, gritando para a platéa:

"Eu sou um "quebrado”...

Entretanto tenho ainda no bolso ou'nhentos mil réis para dar dama que queira vestir este vestido sob a pressão de 4.500 volts`s!

Nesta altura o mundo foi abaixo...

Assobios, gargalhadas, bater de cadeiras, um inferno...

Ouvindo falar em 4.500 volts, muito embora todos soubessem que a força em  Florianópolis não vai além de 200, preferiram abandonar a sala de espectaculos, deixando-os ás moscas a ver Maruja electrocutada...

O que se passou deve servir de exemplo. E' sempre perigoso elogiar, antes de ver para crer como São Thomé...”

A Noticia (SC) 27 de Abril de 1940.


    Não contente com as críticas feitas ao espetáculo Rosel enviou uma carta ao jornal nos seguintes termos:

Carta aberta, dirigida ao Sr Mimoso Ruiz, diretor da surcursal de “A notícia de Joinville, em Florianópolis, em resposta ao artigo publicado nesse de 27-4-1940.

“Senhor diretor. Oh! Ironia. E V.S. se chama “Mimoso” quando na realidade é “monstruoso”, Monstruoso por abusar da digna profissão de jornalista para difamar indignamente um casal de artistas patrícios que procuram honradamente ganhar o pão a de seu filhinho, que amanhã irá defender a nossa Pátria. Quando vejo indivíduo de sua classe, sem coração, sem entranhas, sem sentimento humano, que, por prazer de fazer o mal, escreve um artigo tão violento inventando e insultando grosseiramente uma família, fechando para as mesmas as possibilidades de trabalho em todo o Estado, sem preocupar-se das dificuldades que já atravessam os artistas na nossa Pátria, duvido que esse carrasco seja  Brasileiro e se por acaso fôsse... me daria vontade de naturalizar Chinês ou Turco...

 Senhor “Mimoso” deixe de prosar sobre Pastora Império y que V.S. nunca sonhou ver e sobre Lisboa que só terá visto no mapa (se conhece geografia...), porque se o senhor fôsse pessôa viajada não escreveria tais indelicadezas sobre uns pobres artistas e se ocuparia, na página do seu jornal, de assunto mais interessante para seus leitores.

Lendo sua “critica” pouco elegante, cheguei a esta conclusão: que o “ilustre” sr. “Mimoso” não assistiu sequer ao espetáculo do Rex ou, então, estava sob qualquer INFLUENCIA que o tirava da realidade, visto que o senhor cita a Maruja Natal “tocando castanholas sem ritmo”...; e (coisa curiosa!) Maruja, todos os espectadores sabem, NÃO TOCOU CASTANHOLAS, o que prova que o senhor “Mimoso” não estava no Rex ou sе encontrava no mundo da lua....

 Ainda mais uma prova de que o sr. “Mimoso” não estava no Rex, ou estava dominado pelas aludidas influências, é que trata de “orquestra de cavaquinho e violão” o ótimo jazz da Força Pública, Insultando assim a 1°orquestra da capital.

 O senhor “Mimoso” não esteve no Rex para descrever a Boneca Luminosa atada por um “cabo de navio”, Rosel lançando faiscas incendiárias pelos olhos, ameaçando a platéia com seus mortais 4.500 volts`s, o público vociferando, tomado de súbita loucura, dando estrondosas gargalhadas, assobiando, batendo cadeiras, entim o tal INFERNO da sua Imaginação...

 Felizmente, a platéia de Fpólis, é culta, não assobia, não bate cadeiras, não dá gargalhadas; ao contrário: aplaudiu todos os nossos números, e se os artistas não fossem do seu agrado ficaria aristocraticamente calada.

  O senhor “Mimoso” não foi ao espetáculo do Rex e talvez a nenhum espetáculo, e não conhece o público de Florianópolis, que é uma das mais lindas capitais de nosso grande Brasil e não está situada em nenhum país de selvagens, como o faz sugerir o seu artigo; pois quem o lêr terá uma triste e errada impressão de Sta Catarina, e, até, medo de vir a este Estado, cuja “elite” (feminina e masculina) assobia, quebra cadeiras, dá gargalhadas e, num “barulho infernal”, só imitável por péles-vermelhas, acaba, destruindo e incendiando o Cinema... “Só porque dois pobres artistas não conseguiram agradar-lhe.”

Desejo muitas venturas a V. S.

ROSEL

 

E veio a resposta do Senhor Mimoso, no dia primeiro de maio:


De “chansonier” francez, transmudou-se em “canconetista” Brasileiro

FPOLIS, 30-O sr. Hosel, que se annunciára aos quatro ventos como "chansonier” francez, em "Carta Aberta" por intermedio de "O Estado" refuta a nossa chronica, declarando-se, preliminarmente, cançonetista brasileiro.

 Para responder-lhe não iremos gastar cêra com ruim defunto. Para ajuizar o que foi o seu espetaculo, bastará dizer que, annunciados tres espectaculos, foi "uma noite a Cascaes e nunca mais...”

 E o que é mais; jornaes que haviam posto o "duo” nas hartes da lua, julgaram de bom aviso nem siquer dizer que tinha havido o espectaculo...

 Quanto a não havermos nem siquer sonhado com Pastora Rojas a "Bella Imperio"; nem com “Argentinita", nem com a "Furnarina", nem com a  Nina de los Peines” não vae ao caso.

Basta que houvéssemos visto Maruja Natal e Rosel, porque tendo-os visto cessou tudo quanto a musa cantou, porque outro poder mais alto se levantou...

 Quanto a não conhecermos a capital lusa. O Sr. Rosel tem razão. Ainda outro dia, tendo-nos alguem pedido que indicassemos com o dedo, no mappa onde ficava Lisboa, nós apontamos com o “fura-bolo” a Patagonia...

Mas, deixemo-vos de ironia vamos falar sério.

 O sr. Rosel achou "monstruosa” a nossa chronica Mas, a nossa chronica tinha de ser assim mesmo. A apresentação de especimens como a "duo" que surgiu no "Rex" criam no público uma atmosphera prejudicialissima aos artistas com valor e com merito, porquanto o publico em  presença de tais "pochades", acaba por descrer dos reclamos, medindo a todos pela mesma bitola.

 Fosse p Sr Rosel modesto, não se empavonando com títulos estrangeirados, nem com contractos em Nova York, para ludibriar o publico, e nós silenciaríamos como fizeram os outros jornaes.

Precisamente porque Florianópolis é uma cidade culta; precisamente porque não é habitada por "pelles-vermelhas", é que os empresários deveriam ter mais respeito pelo publico e os artistas o equilíbrio necessário para só se exhibirem em logares que estejam dentro das suas possibilidades.

 A notícia 01 de maio 1940.

    

    Ainda não sei dizer, se houve resposta ou as trocas pelos jornais continuaram, não encontrei mais nada, mas ao ler todas essas informações, achei que o crítico pegou pesado com Rosel, continuei rastreando a Maruja, e fiquei curiosa em saber também sobre o Tenor, que me parecia tão gentil e educado.

    Em 1952 a Associação Brasileira de Imprensa estava realizando um festival com o Fernad Rosel e a Maruja Natal. Eles se apresentaram também em Niterói no Teatro Municipal João Caetano, bailarina do Clássico Espanhol. Depois não encontrei mais informações sobre ela, e muito menos da "Boneca Luminosa".

Já o Rosel...

    Nos anos 30 ele colocou um anúncio no Jornal dizendo que estava recrutando moças para um coro. Trabalhou com Guillermo Galindo, Bertha Noronha, Pierina Leguti.

    Em 1938 no Paraná, a troupe de Rosel apresentava um espetáculo com um artista que se chamava “Marconi Hindu”, o Rei das Luzes, que apresentava a "Boneca Luminosa", mas também não encontrei, até o momento algo sobre Marconi Hindu. Teria se apropriado Rosel da Boneca luminosa e estreado em Florianópolis em 1940?

    O Jornal Pequeno (PE) em 1948 anunciava que Fernad Rosel o “Artista Francês” esteve em Rio Grande do Norte, o “Tenor brasileiro, esteve também em Paramaribo; No Pará, anunciaram que esteve no Peru, Buenos Aires, Canada e EUA. 

    No “Maranhão em 1949, publicou o jornal o “Artista Cubano”, “ludibriou”, “maior abacaxi que nos deram para descascar”.

     Depois do ocorrido em Florianópolis Rosel ainda voltou à cidade em 1958 e 1961, mas agora sem críticas nos jornais. E nos anos 70 ainda veio cantar em um recital no Rio de janeiro. Esse moço devia ter muitas histórias para contar!

 



[1] Temos como referência nos jornais de Maruja Natal 1937 no Jornal do Comércio Rio de Janeiro, numa companhia de Teatro de Revista como bailarina hespanhola, no Diário da Noite desse mesmo ano o jornal critica a “ voz inteiramente anasalada, vae mal cantando”. Em 1938 estava no Teatro Rival.

Imagem do cinema Rex foi retirado do blog, que vale dar uma espiadinha que conta sobre os cinemas de Florianópolis. 

http://floripendio.blogspot.com/2010/06/cinemas-de-rua-de-florianopolis.html


Obs.: Caso queira retirar informações deste blog, por gentileza cite e referencie a pesquisadora deste lindo trabalho: Alessandra Gutierrez Gomes.

Mariucha em Florianópolis - 1925

Fonte:A Notícia,1925,ed. 00174 Faz um século que  Mariucha veio a Santa Catarina com os concertistas de bandolim e guitarra premiados pelo R...